No Brasil, startups têm se beneficiado de um ambiente de juros baixos e necessidade constante de inovação para conseguirem crescer. Em 2020, US$ 3,5 bilhões foram destinados a essas empresas, valor de captação recorde. Enquanto os estímulos financeiros seguem um caminho de consolidação no país, no aspecto regulatório, o principal passo para assegurar quem são as startups e mostrar caminhos para seu desenvolvimento começaram a se tornar evidentes no último ano, com o andamento do Marco Legal das Startups.
O texto — que ainda precisa da aprovação final da Câmara para entrar em vigor no país — é elogiado por empreendedores ouvidos por EXAME na medida em que define quais empresas podem ser definidas como startups, algo que ainda não existia formalmente no país; fornece mais segurança aos investidores no que diz respeito a possíveis dívidas feitas por essas empresas (de forma adicional ao que já existia na “lei do investidor-anjo”, a LC 155/2016); e cria regras claras para que participem de licitações junto ao poder público — o que é visto com otimismo do ponto de vista de trazer inovação de forma mais rápida para esses espaços.
Ao mesmo tempo, existe certo consenso de que o Marco Legal poderia ir além dessas medidas para fortalecer o ecossistema de startups e desenvolvê-lo ao longo do tempo. Para empreendedores e investidores, alguns desses pontos são: a ausência de tributação diferenciada para startups ao se tornarem Sociedades Anônimas (com o objetivo de não trazer uma carga tributária maior na medida em que buscam por mais governança) e a falta de estímulos tributários para investidores (por exemplo, a isenção de imposto de renda sobre os aportes feitos em startups na bolsa).
“Até mesmo papéis como as Letras de Crédito contam com tributação diferenciada justamente para estimular os investimentos. Por que isso não pode acontecer com as startups?”, diz Diego Perez, presidente da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs).
Além disso, o plano de stock-options, uma ferramenta capaz de ser usada para atrair talentos de forma mais efetiva, também é considerado importante para as empresas que estão começando — e que ainda não têm o capital necessário para contratar talentos, por exemplo.
“Se alguém quer sair de uma posição sólida em uma grande empresa para se arriscar em uma startup, essa é uma medida que pode garantir algum tipo de retorno no futuro”, defendem Paulo Arruda, co-CEO da startup de ensino Park Education, e Renato Ticoulat, presidente da Limpeza com Zelo, focada em residências, escritórios e condomínios.
Como forma de defender esses pontos junto aos agentes públicos, 37 organizações do setor enviaram uma carta ao Senado Federal, na qual endereçaram essas questões e pediram apoio dos senadores para viabilizá-las. EXAME teve acesso ao documento, em que os representantes das startups são enfáticos:
“Sem estes pontos, o impacto efetivo do Marco será menor que o necessário para que o Brasil possa acelerar sua inovação. Inovar não é uma opção para os países, mas uma necessidade. E, embora tenhamos tido um grande desenvolvimento do ecossistema de investimento e startups nos últimos anos, ainda estamos muito atrás quando comparamos o Brasil com outros países e com o potencial que temos”, diz a carta.
Como e por que resolver
Uma solução duradoura para os aspectos tributários discutidos pelos empreendedores passaria por uma reestruturação ampla da política de tributos aplicada aos investimentos no país, segundo Diego Gualda, sócio especializado em tecnologia do escritório Machado Meyer.
A inclusão desses pontos no Marco Legal seria um ponto válido para começar, mas, segundo ele, é necessário manter a atenção ao volume de exceções aos tributos para não gerar insegurança jurídica no país em longo prazo.
“O caminho ideal para melhorar o ambiente de negócios no Brasil, na minha visão, seria o de uma neutralidade tributária em relação a investimentos. O que estamos fazendo é criar um regime especial, como sempre fazemos no país, dessa vez relacionado às startups. Isso pode tornar a legislação ainda mais complexa, em vez de torná-la mais clara e segura. É um primeiro passo, claro, mas não sei se é o ideal para resolver o nosso atraso de ambiente de negócios”, diz.
A melhora do ambiente regulatório poderia colaborar para trazer mais segurança e, portanto, mais chances de atrair investimentos para essas empresas — pontos fundamentais em um país cujos empreendedores enfrentam dificuldades como acesso ao crédito e a burocracia.
“Morei dez anos na Austrália e o que vejo, no Brasil, é uma tentativa de nos tornar mais competitivos. Lá, eu não precisava nem mesmo de contador para abrir minha empresa, fazia tudo on-line e, se quisesse, passava o documento apenas para o profissional conferir se estava tudo correto. No Brasil, isso é impossível. Tudo é muito complexo”, diz Maucir Nascimento, diretor de expansão da Speedio, focada em facilitar vendas entre empresas.
Na comparação global, o ranking de Melhores países para empreender, feito anualmente pelo US News em parceria com a Universidade da Pensilvânia, mostra que o Brasil ocupa a 37ª posição entre os 78 países analisados e a governança é um dos principais fatores relacionados a essa colocação. Na liderança, estão Japão, Alemanha, Estados Unidos e Reino Unido.
Apesar dos pontos que poderiam ser melhorados, há quem tenha se beneficiado com um outro lado trazido pelo Marco Legal em relação às startups: medidas mais claras para participar de licitações junto ao setor público. O texto permite que a esfera pública contrate pessoas e empresas para teste de soluções inovadoras.
Para a Gove, startup de controle de finanças públicas, esse é um movimento que deve trazer benefícios ao longo dos próximos anos. Atualmente, a empresa está presente em 33 cidades e estima chegar a 70 até o fim de 2021. Adotada pela prefeitura de Poá (SP), a solução da companhia gerou R$ 48 milhões em economias ao tesouro municipal.
Antes do marco legal, alguns entraves ganhavam espaço nessa relação entre setor público e privado. A startup cita dois, presentes na Lei 8.666: a exigência de três orçamentos para qualquer tipo de serviço — o que gera entraves em serviços inovadores e, de certa forma, únicos no país –, a necessidade de encontrar uma comissão de três pessoas que tenham conhecimento sobre o tema.
Com as mudanças geradas a partir do novo texto, a possibilidade de julgar uma empresa vencedora a partir do ganho que ela vai trazer para a administração pública colabora para fortalecer a relação entre ambos os agentes.
“O Marco Legal cria um ambiente mais seguro para apresentar sua solução a um gestor público. Além disso, permite que duas empresas sejam contratadas para resolver um mesmo problema, o que é ótimo. Hoje, de 100 prefeituras que se interessam pela nossa solução, apenas 25 chegam a contratá-la. Esperamos que esse número aumente a partir deste ano”, explica Rodolfo Fiori, cofundador da Gove.
O marco legal traz, portanto, mais um motivo para startups que atuam no setor público acreditarem na digitalização do país. No último ano — o mesmo em que o marco legal começou a tramitar no Congresso –, o Governo Federal lançou a Estratégia Digital 2020-2022, que estabelece os planos de transformação digital para o país.
A principal meta estabelecida é a de digitalizar 100% dos mais de 3 mil serviços prestados pela União por meio do portal gov.br. De acordo com as informações divulgadas pelo governo, isso poderia colocar o Brasil “entre os 15 países mais desenvolvidos do mundo em serviços públicos digitais, o que é medido a cada dois anos pela ONU como parte do Índice de Desenvolvimento de Governo Eletrônico”. De acordo com as informações divulgadas pelo ranking de 2019, o Brasil ocupa a 20ª posição entre as 20 nações mais desenvolvidas — os líderes são Coreia do Sul, Estônia, Dinamarca e Finlândia, na ordem.
Nem tudo está perdido
Apesar de empreendedores defenderem mudanças mais representativas do que as já conquistadas na versão atual do Marco Legal das Startups, sua aprovação (ou reprovação) não deve eliminar o apetite dos investidores por inovação no país. Tê-las é um benefício claro — já que projetos de lei futuros demorariam ainda mais tempo para trazer soluções aos problemas vistos como necessários — mas há um consenso de que o investimento deve continuar chegando ao país.
“Chegamos aonde chegamos sem nenhum amparo regulatório para as startups e, por isso, acredito que o futuro deve ser melhor para elas. Quanto mais fortalecidos os empreendedores estiverem, mais o ecossistema de inovação do país tem a ganhar”, afirma Daniel Chalfon, sócio da Astella Investimentos, gestora de investimentos em Venture Capital brasileira com foco em empresas nos estágios “Seed” e Série A.
Nesse sentido, grandes empresas já têm se mobilizado para investir em startups locais. O grupo Ânima, de educação, está entre os investidores dispostos a fornecer esse tipo de crédito privado. A companhia realizou no último ano a aquisição da MedRoom, startup de realidade virtual para educação médica, cujo valor não foi revelado. Além disso, por meio da sua vertical de educação executiva HSM, criou o Learning Village, hub de inovação e educação para startups.
“A aquisição da MedRoom faz parte da nossa estratégia ‘ambidestra’, de olhar para o mercado ao mesmo tempo em que focamos no nosso core business. Já o Learning Village é resultado de um planejamento de três anos para colocá-lo em prática”, diz Reynaldo Gama, CEO da HSM. “Na nossa avaliação, o Marco Legal contribuiu para nos aproximarmos dessas startups, já que, para uma empresa de porte de capital aberto se aproximar desse ecossistema, as regras precisam estar muito claras”, afirma Guilherme Soarez, vice-presidente de Crescimento e Educação Continuada da Ânima Educação.
A seguradora Porto Seguro também investiu ao aumentar a participação na startup PetLove, dedicada ao cuidado com pets, como a EXAME noticiou. Focada em oferecer soluções em diferentes pontas para o mercado pet, a empresa projeta faturamento de R$ 900 milhões em 2021.
Até mesmo quem atuava em setores que naufragaram durante a pandemia conseguiu tirar seu filão. A plataforma de guias e experiências iFriend conseguiu levantar R$ 2 milhões em uma rodada organizada no início deste ano, que contou com mais de 300 investidores. Os aportes foram organizados pela CapTable, plataforma dedicada ao investimento nessas empresas — que viu espaço promissor para a empresa crescer após o avanço da vacinação.
Startups já consolidadas no país – como Nubank e Loft, por exemplo — também se beneficiaram do apetite de investidores. O Nubank, maior startup privada da América Latina, está avaliado em mais de US$ 25 bilhões e, em janeiro, recebeu aportes de US$ 400 milhões. “2021 é o ano em que buscaremos o crescimento da base de clientes e a diversificação de produtos” disse David Velez, à época.
Em 2020, a Loft recebeu 175 milhões de dólares em fundos, o que tornou a startup o 3º unicórnio do país. Em relação ao marco legal, a companhia acredita que a segurança jurídica trazida para empreendedores é um ponto essencial para que mais empresas possam crescer e se desenvolver no país, especialmente com o acesso ao crédito.
“Para nós, é favorável a possibilidade de agilizar e facilitar o início das operações de uma startup, devido às propostas de mudança nos campos administrativo, fiscal e trabalhista. É importante ressaltar o trecho do referido projeto que traz a possibilidade de participação dos estados em startups, através da disponibilização de capital por meio de seus bancos, financiadoras e agências de fomento. Isso agrega relevância ao segmento e proporciona mais uma fonte expressiva de recursos ao empreendedor”, diz Renata Feijó, vice-presidente da área jurídica da Loft.
A importância do acesso ao crédito — seja para formar mais unicórnios ou não — é um dos principais pontos apontados por startups do mundo todo para se desenvolverem. Um estudo da CB Insights, empresa de inteligência de mercado focada em análise de investimentos, mostra que a falta de dinheiro em caixa é a segunda principal razão pelas quais as empresas quebram.
De olho em garantir inovação e ter acesso a um volume maior de startups de uma única vez, os laboratórios Fleury e Sabin criaram um fundo de investimentos em startups (chamado Corporate Venture Capital) de R$ 200 milhões, chamado Kortex. A meta, com o investimento, é se tornar sócio de 15 a 18 startups ao longo dos próximos quatro anos, segundo a empresa.
Para Gustavo Cavenaghi, diretor de investimentos e de portfólio na Kortex, o Marco Legal pode fomentar ainda mais o setor de saúde — já tão em voga por causa da pandemia.
“O marco legal ajuda principalmente as empresas que estão no início da cadeia de procurar por investimentos, visando ali quem procura por investidores-anjo. Não é o nicho em que investimos, mas isso pode permitir que essas empresas cresçam e cheguem a um estágio de Série A, que é justamente o nosso foco. Tenho certeza de que o marco pode ajudar o dia a dia dessas empresas, principalmente no que diz respeito à burocracia. Vamos alocar capital nos próximos anos para ajudar ainda mais essas empresas”, diz.
Fonte: Exame
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